23 de junho de 2022

Até onde vai seu voto

Até onde vai seu voto
Ricardo Holz

É muito comum que as pessoas pensem que o voto delas acaba depois de dar o ‘confirma’ na urna eletrônica. Ela escolheu aquele que lhe pareceu o mais adequado para ocupar aquela vaga, votou nele, pode ou não ter tentado convencer outras pessoas a também votarem em seus candidatos e pronto, fez sua parte. Mas esse é um raciocínio preguiçoso, e mais, poderíamos até dizer que seja uma ação burra mesmo. A esmagadora maioria do eleitorado brasileiro acaba esquecendo em quem votou após sair da cabine eleitoral, não sabe sequer dizer se seu candidato a vereador, deputado estadual e deputado federal conseguiram ser eleitos ou não, quem dirá acompanhar o trabalho que está sendo realizado.

Quem em sã consciência contrata um profissional e não fiscaliza seu trabalho?

Se você, em sua empresa ou em sua casa, faz esse tipo de coisa, lamentamos dizer, mas a probabilidade que você receba um serviço mal feito ou, pelo menos, diferente da forma que contratada, é muito grande.

É claro que administrar um país, ou legislar, não importa em qual âmbito de atuação, é muito mais complexo do que construir um muro, diagramar uma página, arrumar e limpar uma casa ou abrir e fechar uma porta, mas o princípio é o mesmo: é um serviço prestado, e, aliás, este é um serviço que é muito bem remunerado. Então seu voto não termina quando você aperta o confirma e vai pra casa satisfeito por ter feito sua parte para o bem do país, não. Ele continua depois disso em pelo menos dois momentos.

O primeiro é no caso de seu candidato não ter vencido. Veja, se este candidato que não é o da sua escolha venceu, é porque foi eleito pela maioria, e esta é uma realidade que não se pode alterar. O fato de querer que outro candidato tivesse assumido aquela vaga faz com que você assuma, naturalmente, o dever moral de ser o maior, não opositor, mas fiscalizador daquele empregado, justamente para demonstrar aos outros, aqueles que o escolheram que eles contrataram uma pessoa inepta para a função. Se um candidato, eleito democraticamente, assim que toma posse começa a pregar o fim da democracia, independente de qual espectro político ideológico seja, deve ser sumariamente alijado da função, demitido por justa causa, afinal, o que você faria se o novo porteiro do seu prédio, assim que contratado dissesse que agora, a partir daquele momento o prédio, bem como todos os apartamentos, passam a ser de sua única propriedade? Enfim, é exatamente essa indignação que devemos ter com os nossos funcionários políticos.

Continuando, para os que votaram no candidato que venceu as eleições, surge então outra grande responsabilidade, ainda maior do que para a pessoa que votou no candidato derrotado, porque foi justamente através da sua permissão que aquele candidato foi ‘contratado’. Então nesse caso a fiscalização do seu trabalho deve ser ainda maior por parte do eleitor, porque para além de este estar no posto de comando graças à sua escolha direta, ele também deve prestar contas, não para você diretamente, mas para todos os condôminos do Brasil, ou de uma cidade, ou de um Estado, afinal ele passou a ser funcionário de todos, mesmo daqueles que não o escolheriam, e essa responsabilidade recai sobre os ombros das pessoas que nele votaram. Isso torna você corresponsável, ao menos moralmente, das ações daquele funcionário.

Vamos retornar ao exemplo de uma empresa. Suponha agora que você tenha uma empresa em sociedade com um amigo, veja, você e ele, apesar de trabalharem juntos, possuem certas diferenças, que são muito úteis para solucionar diferentes problemas, até porque, como todos sabemos, pessoas que pensam de forma igual tendem sempre a recorrer aos mesmos tipos de pensamento para solucionar a alguma questão problemática, e isso não é saudável em nenhuma empresa. Então vamos supor que, em dado momento, seu sócio tenha contratado um funcionário para gerir determinado setor da empresa, e que o tenha feito apesar da sua resistência, pois bem, se este funcionário não cumprir o papel para o qual foi contratado, ou melhor, extrapolando ainda mais a situação, se este funcionário tentar dar um golpe em vocês dois e assumir o controle de sua empresa, ele será por óbvio demitido, correto? Com certeza. Mas a quem você irá responsabilizar pela contratação desse ser abjeto e incompetente? Ao seu sócio.

Isso funciona em qualquer empresa, em qualquer lugar, mesmo na sua casa, quando por ventura acontece de um dos integrantes do casal contratar alguém que rouba a casa, é comum e até esperado que o outro membro do casal ao menos censure a pessoa que escolheu, justamente porque não soube fazê-lo bem. É por isso que, quando se vota no candidato que foi escolhido para a vaga, deve-se manter ainda mais vigilante quanto de suas ações no decorrer do cargo, porque você passa a partilhar com ele o desempenho de suas funções, senão de forma prática, com certeza do campo de vista da moral e da ética.

Agora, não adianta, por exemplo, fiscalizar este funcionário sob qualquer prisma que não seja o de resultados concretos que seu trabalho esteja gerando. Da mesma maneira, não se deve manter um funcionário, ou uma funcionária incompetente apenas em razão de sua beleza, ou porque é seu amigo, ou por qualquer coisa que seja e que não se resuma apenas aos resultados que entrega, porque esse tipo de escolha enviesada por outros fatores pessoais, no geral prejudica toda a saúde financeira e competitiva da sua empresa, bem como um mandatário ruim pode, e em geral vai, prejudicar ao país ou a cidade inteira por sua simples incapacidade, quer seja moral quer seja técnica — e em muitos casos verifica-se os dois, a incapacidade moral aliada a uma incapacidade técnica. É assim que candidatos envolvidos em escândalos e acusações de corrupção até o pescoço continuam sendo reeleitos.

Todo o extenso caminho que percorre o seu voto é importante, desde a escolha de um candidato até a sua fiscalização, e esta deve ser exercida diuturnamente, não sob aspectos emocionais, mas sim sob aspectos práticos, de qualidade do serviço realmente prestado. Este é o poder que você tem nas mãos, e não o usar, sinceramente, é a mesma coisa que rasgar dinheiro, ou é o mesmo que colocar as mãos em um fio de energia desencapado repetidas vezes e continuar esperando que em algum momento não se tome um choque…

* Ricardo Holz, é especialista em administração pública e autor do livro “Manual básico para não ser enganado por políticos.”

@ricardoholzoficial

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