Scream fake: operação que investiga o PCC cumpre mandados em Flórida Paulista e Irapuru
Megaoperação é realizada pela Polícia Civil e Ministério Público.
A Polícia Civil, por meio da Central de Polícia Judiciária de Presidente Venceslau, e o Ministério Público do Estado de São Paulo, por intermédio do Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Presidente Prudente, desencadearam na manhã desta terça-feira (14) a operação denominada “Scream Fake”, falso grito em tradução livre, visando o cumprimento de 12 mandados de prisão preventiva, 14 mandados de busca domiciliar, e a implementação de medidas cautelares de suspensão das atividades de uma ONG (organização não governamental) e bloqueio de suas redes sociais. As ações visam desarticular engrenagens da organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Os mandados foram cumpridos nas cidades de São Paulo, Presidente Prudente, Flórida Paulista, Irapuru, Presidente Venceslau, Ribeirão Preto, Sorocaba, Guarulhos e Londrina (PR). Dentre os mandados de prisão preventiva cumpridos constam três advogados apontados como integrantes da facção criminosa, e ainda a presidente e o vice-presidente de uma ONG.
Conforme divulgou a Polícia Civil, a operação é fruto de investigação em curso há cerca de três anos e teve início a partir da tentativa de ingresso de uma visitante na Penitenciária II de Presidente Venceslau com mídias externas ocultas em suas vestes, as quais foram apreendidas e analisadas.
As circunstâncias e indícios colhidos pela investigação, notadamente com as apreensões dos cartões de memória e dos manuscritos (2021), conjugadas com informações de inteligência e também extraídas de outras investigações, apontaram para a atuação de algumas engrenagens da facção criminosa PCC, inclusive com o delineamento das ações ilícitas executadas por meio de três setores (Gravatas, Saúde e Financeira). A apuração ainda revelou a existência de um novo setor, até então, em pleno funcionamento dentro da facção, ora denominado “Setor das Reivindicações”.
Plano de saúde do crime organizado
Em nota a Polícia Civil detalhou sobre as engrenagens investigadas. Os elementos revelados indicam que advogados vinculados ao “Setor dos Gravatas”, um ramo dedicado ao exercício de atividades estranhas a assistência jurídica, promovem o gerenciamento do “Setor da Saúde”, cooptando médicos e dentistas, sem qualquer vínculo com o crime organizado, para prestarem atendimentos particulares e exclusivos a detentos faccionados e custodiados, em regra, na Penitenciária II de Presidente Venceslau e Centro de Readaptação Penitenciária (unidade em que vigora o Regime Disciplinar Diferenciado).
A investigação ainda apontou que esses indivíduos, beneficiados com esses atendimentos, normalmente guardam relevância na estrutura piramidal da organização criminosa, funcionando o “Setor da Saúde” como uma espécie de “plano de saúde do crime organizado”, um plano bastante seletivo.
Os profissionais médicos e dentistas que acabam aderindo – ainda que inconscientemente – ao “Setor da Saúde”, passam a ser remunerados pelos serviços prestados com recursos ilícitos da organização criminosa, por meio do “Setor da Financeira ”, com valores majorados e expressivos pagos mediante depósitos não identificados, transferências bancárias originadas de contas em nome terceiros desconhecidos ou por meio de transferências realizadas diretamente pelo advogado ao profissional médico/dentista ou a clínica a ele vinculada.
A partir das oitivas dos médicos e dentistas, a investigação apurou que os atendimentos prestados incluem os mais variados serviços, inclusive com intervenções estéticas e cirúrgicas, muitas vezes sem qualquer conhecimento do preso/paciente dos detalhes sobre as tratativas de valores e a forma de pagamento aos profissionais liberais. A investigação constatou que os atendimentos são coordenados e executados pela organização criminosa em benefício de integrantes qualificados, normalmente ocupantes de funções de destaque no âmbito da facção criminosa PCC.
Assim, a investigação comprovou, mais uma vez, que a facção financia atendimentos de saúde a alguns de seus integrantes, realizando o pagamento de tais serviços, com sobrepreço, através dos recursos obtidos junto ao seu caixa ilegal, alimentado com valores obtidos através das práticas criminosas que desenvolve.
Assim, o Setor da Financeira alimenta o Setor da Saúde, sendo tudo intermediado pelo Setor dos Gravatas que, apesar de composto por advogados, estes não exercem atos atinentes à advocacia, mas sim atuam como verdadeiros integrantes da facção.
ONG atuava para desestabilizar o sistema de justiça criminal e manipular a opinião pública
Apesar de tais constatações, o foco da operação policial e, talvez a descoberta mais importante dessa investigação, segundo a Polícia Civil e o Ministério Público, foi que se verificou no material apreendido a preocupante atuação da organização criminosa por meio do agora denominado “Setor de Reivindicações” – o quarto setor atingido nesta ação.
A finalidade desse setor seria o de promover ações judiciais ilegítimas, manifestações populares desvirtuadas e denúncias infundadas, para desestabilizar o sistema de justiça criminal e colocar a opinião pública contra o poder estatal.
Esse novo setor, descoberto na investigação, é operado da mesma maneira que os demais, através de intermediários, neste caso, tal qual no Setor da Saúde, pelos mesmos advogados que integram o Setor dos Gravatas.
A investigação verificou ainda que as ações do “Setor de Reivindicações” estão sendo executadas por meio da ONG Pacto Social & Carcerário S.P – Associação de Familiares e Amigos de Reclusos, sediada no interior de uma comunidade na cidade de São Bernardo do Campo, e sem qualquer identificação ou movimentação de que a entidade esteja realmente em efetivo funcionamento.
A investigação comprovou, de maneira técnica, que a ONG, criada com a ajuda do Setor dos Gravatas, segue prestando contas à facção criminosa. Ao lado das prestações da contabilidade do tráfico de drogas e demais recursos ilícitos, a cúpula da organização criminosa recebe atualizações sobre a atuação da ONG e de como ela vem atendendo aos interesses da facção, através daquelas manifestações e demais ações diretamente manietadas pela facção.
Por fim, revelou-se que a organização criminosa, ainda fazendo uso da atuação dessa ONG, também orquestra de maneira contemporânea ataques a agentes públicos, que deveriam ser praticados no contexto de represálias e acompanhadas de falsas acusações/divulgações de abusos por parte de agentes estatais, um servindo de justificativa ao outro. De um lado integrantes da facção atentariam contra os funcionários públicos, de outro, a ONG dissemina bravatas vazias relacionadas ao sistema penitenciário – repercutindo em última análise em uma desestabilização de todo o sistema de justiça criminal.
A investigação ainda demonstrou que a facção invadiu a sociedade civil organizada e vem, agora, se apropriando de discursos politizados para fazer valer os seus interesses espúrios, tudo em detrimento da sociedade e das instituições constituídas.
Fonte: Siga Mais