O juiz Fabio Alexandre Marinelli Sola, da 1ª Vara da Comarca de Adamantina, julgou improcedente a Ação Civil Pública movida contra o Centro Universitário de Adamantina (UniFAI) pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), que buscava a concessão de descontos de 20% nas mensalidades dos estudantes da Autarquia Municipal em razão da pandemia do novo coronavírus (Covid-19).
A ação judicial foi proposta após a apresentação de Representação Civil por parte da Associação de Pais dos Estudantes do curso de Medicina (Pais MedFAI) na primeira semana de julho, alegando a “acentuação das dificuldades econômicas devido à pandemia”.
Dentre os pedidos do MP-SP estavam a “redução de 20% nas mensalidades a partir do mês de setembro de 2020, enquanto durar o isolamento social e a impossibilidade de prestação do serviço contratado, na forma presencial, a compensação das mensalidades que já foram quitadas de forma integral referentes aos meses de março, abril, julho e agosto mediante desconto adicional nas próximas mensalidades, além da suspensão de qualquer cobrança a título de inadimplência contratual para os consumidores que optassem por rescindir o contrato”.
Em juízo, a Procuradoria Jurídica da UniFAI sustentou que “não houve mudança nas bases contratuais, ocorrendo apenas alteração na forma de execução do contrato, diante da crise estabelecida pela pandemia, sendo necessária a substituição das aulas presenciais por aulas à distância, medida imposta pelo Governo e órgãos superiores, ministradas de forma remota, em tempo real, mantendo a interação entre alunos e professores”.
A defesa afirmou ainda que “as despesas da Autarquia nesse período aumentaram e as receitas diminuíram. Os efeitos da pandemia afetaram a todos, com reflexos em ambas as partes, não caracterizando desequilíbrio contratual”, requerendo, assim, a improcedência da ação.
Sentença
Na sentença, o juiz Fabio Sola reconheceu que “desde março deste ano, o País e o Mundo enfrentam a pandemia de causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), sem previsão de término até o momento, sendo adotadas, pelo Poder Público, medidas sanitárias para controle da doença, dentre as quais o distanciamento social, que resultaram na diminuição da atividade econômica, com a consequente redução de salário em diversas categorias, desemprego dentre outros efeitos prejudiciais”.
“Não se olvide os danos causados à economia decorrentes da decretação do estado de calamidade pública e da quarentena, em razão da pandemia de Covid-19, contudo, no presente caso, não se cogita aplicar-se a teoria da imprevisão, a fim de se determinar a revisão de contrato com a redução em 20% das mensalidades escolares, dentre outras providências requeridas pelo Ministério Público. A teoria da imprevisão tem aplicabilidade quando uma situação nova e extraordinária surge no curso do contrato, colocando uma das partes em extrema dificuldade. Contudo, esta teoria não pode ser aplicada apenas em favor de uma parte da relação, no caso os alunos, uma vez que os efeitos da quarentena decorrentes da pandemia do Covid-19 também atingiram a requerida [UniFAI]”, prosseguiu o magistrado.
O MP-SP havia apontado a ocorrência de uma suposta “redução significativa nos gastos operacionais” da UniFAI devido à suspensão das aulas presenciais. Porém, a Instituição de Ensino Superior apresentou provas em sentido contrário, ou seja, que as despesas totais aumentaram após o início da pandemia e, por outro lado, as receitas diminuíram se comparadas ao ano anterior.
“Ademais, comprovou a Autarquia que houve redução no número de alunos matriculados e elevado aumento na inadimplência. Destacam-se, ainda, as despesas com custeio de novos sistemas de operacionalização e capacitação dos docentes e servidores, além dos gastos com testagens de Covid-19”, destacou o juiz.
Segundo dados da Divisão Financeira da UniFAI, caso os descontos fossem formalizados conforme pretendido pelo MP-SP, o impacto financeiro acarretaria um déficit de mais de R$ 3 milhões ao Centro Universitário. “Isso sem contar que a aplicação genérica poderia levar a privilégio de alunos que não tiveram a renda comprometida, em prejuízo de outros com perdas mais sensíveis. Em que pese a situação desoladora vivida por inúmeras famílias em todo o mundo, por força dos efeitos diretos e indiretos da pandemia, as instituições de ensino não podem suportar sozinhas os problemas derivados”, pontuou Fabio Sola.
Prestação de serviço
Quanto à prestação de serviço do Centro Universitário previsto em contrato, o juiz salientou que essa nova modalidade de ensino adotada está autorizada pela Portaria nº 544/2020 do Ministério da Educação (MEC), que permitiu a substituição das aulas presenciais por aulas por meios digitais até 31 de dezembro de 2020, em razão da pandemia do novo coronavírus.
“Desta forma, a simples redução de mensalidades, em qualquer percentual, apenas desestabilizaria ainda mais as relações na sociedade civil, já precárias, gerando inúmeros outros problemas financeiros e socioeconômicos. A situação vivenciada por toda sociedade, de forma global, em decorrência da pandemia de Covid-19, que justifica a alteração das modalidades de ensino, em que pese não estivessem previstas em contrato, de forma lamentável, é duradoura e indefinida, mas não eterna. Ademais, os serviços continuam sendo prestados, todavia, de outro modo, o que não significa maior onerosidade, ou onerosidade excessiva suportada pela autora, em contrapartida do enriquecimento da ré”, asseverou.
A sentença evidencia ainda que, “embora alegue a referida Associação Pais MedFAI, que deu origem à Portaria de Inquérito Civil, dificuldade para arcar com os pagamentos das mensalidades, deixaram de instruir a inicial, ou mesmo o Inquérito Civil, com cópia de qualquer comprovante de queda dos rendimentos. Desta forma, a mera alegação de onerosidade, mesmo excessiva, ou a dificuldade imprevista, não bastam para isentar o devedor de responsabilidade”.
Por outro lado, a Autarquia tem disponibilizado aos universitários aulas teóricas on-line e, em relação às aulas e/ou atividades práticas ou laboratoriais, ela afirma que “serão oferecidas oportunamente, atendendo as diretrizes curriculares do curso, não havendo razão para, até o momento, redução do valor das mensalidades, considerando futura reposição dos serviços temporariamente paralisados”.
“Anote-se, aliás, que a requerida [UniFAI], já concedeu desconto de 20% por dois meses (maio e junho de 2020), autorizada pela Lei Municipal nº 3.978, de 8 de maio de 2020. Em verdade, a Instituição de Ensino em momento algum suspendeu o fornecimento dos serviços prestados, adotando conduta proativa no sentido de manter os conteúdos pedagógicos dos cursos em tempos de pandemia global. A mudança não foi um desejo da Instituição de Ensino, todavia em cumprimento dos decretos expedidos pelo Poder Público, sujeitando-se, inclusive, a rigorosas sanções em caso de inobservância das posturas impostas”, complementou o juiz da 1ª Vara.
Da decisão cabe recurso ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP).